sábado, 21 de abril de 2007

Homenagem - Fernando Pessoa

Álvaro de Campos
Poema em Linha Reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada. Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil, Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita, Indesculpavelmente sujo. Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho, Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo, Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas, Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante, Que tenho sofrido enxovalhos e calado, Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda; Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel, Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes, Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar, Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado Para fora da possibilidade do soco; Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas, Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho, Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia; Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam. Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? Ó principes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado, Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca! E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído, Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear? Eu, que venho sido vil, literalmente vil, Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

domingo, 8 de abril de 2007

Nostalgia

Sinto saudade do frêmito do beijo tão esperado
[mais que molhado.

De nossas bocas, antes ocas, agora cheias uma da outra

De ver teu corpo desabrochar ao toque da minha língua,

Do pudor perdido ante o então prazer inesperado.

Sinto saudade do suor em orvalho, mais que puro,
[abençoado.
Do meu sexo latente em tuas mãos, de tua boca em meu falo;

Da lascívia descoberta e inesperada que nos une
[em paixão velada.

Sinto saudade da cãimbra em minh'alma no momento do gozo,

Dos olhares finais, tão assustados quanto sensuais; das manhas.

E, quando da explosão incontível, da minha essência em tuas entranhas.

sexta-feira, 6 de abril de 2007

No meu rim ( paródia/homenagem não tão bem sucedida)

No meu rim tinha uma pedra
tinha uma pedra no meu rim
tinha uma pedra
no meu rim tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse tormento
na vida de meus filtros tão cansados
Nunca me esquecerei que no meu rim
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meu rim
no meu rim tinha uma pedra.

Poeminha do desfecho ao avesso

Começo no
Fim o com poema o,
Invertida posição em,
Escrevo aqui isso por.
Desfecho o entende nunca mas
Lê quem para feito foi
Avesso do poema O.

Ligação

LIGAÇÃO


-Alô?
-Alô. Júlia?
-Oi, sim, sou eu . Beto?
-Eu sim, tudo bem?
-Tudo bem, e com você? Aconteceu alguma coisa?
-Não, nada de muito urgente...
-Hmm...O que foi? Tá preocupado com alguma coisa?
-Tô. Aliás, tava. Tô te ligando pra dizer uma coisa que acabei de descobrir sobre a gente.
-Hã? Coisa? Que coisa? Sobre a gente?!
-É...na verdade é mais sobre mim, mas acaba te envolvendo também.
-Fala logo Beto, tô com pouco tempo!
-Então...tem a ver com a hora da transa e...
-Olha Beto, se foi sobre aquele negócio de eu ter te enfiado o dedo, eu não quis te of...
-Não, não! Não é isso...na verdade até que foi bom. Mas o assunto é outro. É que...
-Pera, pera! Se foi “até bom” como você disse, porque que naquela noite você não...
-Sim, sim... é isso. É disso que eu quero te falar. Por isso que te liguei. Olha, é muito estranho falar assim, mas é que eu passei mó tempão pensando nisso e acho que já sei o p...
-Pera de novo! Não tô entendendo mais nada! Passou mó tempão pensando em quê?
-Ah tah. Tenho que te falar desde desde o começo.
-Por favor....
-Assim...é que na hora da transa eu fico pensando umas coisas, assim, não sei, acho que é normal...
-Ihhh, não sei não Beto, porque eu, eu não penso em nada.
-Tá, tá certo então, não deve ser tão normal assim, mas eu fico pensando umas coisas...
-Em quê você pensa, Beto?
-Humm, por exemplo, quando tu tá me chupando, tá acompanhando?
-Humrum...
-Então, nessa hora eu penso : “nossa, eu nem acredito que ela tá me chupando! Chupando meu p...”, e é coisa desse tipo que eu fico pensando e..
-E é isso que te faz brochar um montão de vezes, é?
-Não exatamente. Na verdade, é outro pensamento.
-Que pensamento?
-Pô, ja até tentei parar de pensar nisso, mas eu realmente não consigo controlar, entende?
-Sim, sim, mas controlar o quê? Que raios de pensamento é esse?
-Bem, na hora da transa, assim, do nada, eu começo a pensar que você só tá lá porque eu te liguei, entende?
-Sim, mas e não é? Tu me liga e a gente combina? Não é assim?
-É...Mas eu penso que você só tá ali pra não me chatear, como se tivesse fodendo por piedade.
-Ai Beto, que viagem! Se eu trepo contigo é porque quero, não tem des....
-Sim, sim. Eu até sei, mas eu preciso ter certeza, sabe? Eu sempre ligo te convidando pra sair, mas daí eu penso que tu aceita mesmo sem querer muito...
-Claro que eu queria, ou quero, sei lá, Beto! Ai, que papo!
-Tá, tá, tá bom. Então bora fazer assim: só tu me liga a partir de agora, tá?
-Humm. Sempre?
-É...pelo menos até eu me curar.
-Ué, tá bom então. Mas tu acha que isso vai ajudar? Que tu vai parar de brochar?
-Ah, sim! Tenho quase certeza!
-Tá legal, então. Eu te ligo...
-Ok. Daí eu prometo que acabo o serviço!
-Ah, a propósito, você quer sair daqui a pouco?
-Pra onde?
-Prum barzinho na Tijuca.
-Que horas?
-Nove e meia.
-Tá bom, eu vou.
-Me pega?
-Nove horas, ok?
-Ok.Beijo, então.
-Beijo.

Kandinsky

Kandinsky
looking for the rabbit...